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CoMA, um suspiro de renovação em meio ao status quo dos festivais brasileiros

Por Felipe Ernani

Foto destaque por Matthew Magrath

Não importa qual seja o festival da sua preferência — Rock in Rio, Lollapalooza, Bananada, etc. — uma reclamação que você com certeza já fez é: “de novo essa banda?”. Essa reclamação não se aplica ao Festival CoMA, que aconteceu em Brasília entre os dias 10 e 12 de agosto de 2018. Aliás, não só às bandas: o festival manteve uma estrutura básica, mas foi completamente diferente da sua primeira edição (2017).

Uma das grandes propostas do CoMA (Convenção de Música e Arte) é, como o nome sugere, fugir do formato tradicional adotado pela maioria dos festivais Brasil afora. Enquanto alguns destes apostam cada vez mais em medalhões ou em bandas recorrentes para manter um público fiel, o festival brasiliense não tem medo de se arriscar e trazer artistam que fujam do mainstream. Também não tem medo de diversificar o próprio público, confiando em vários fatores além das bandas para fidelizar a audiência: um deles, e talvez o mais importante, é toda a experiência que o envolve.

Além de ter proporcionado uma espécie de Esquenta para o festival (realizado nos dias 28 e 29 de julho, em parceria com o Conjunto Nacional) contando com shows gratuitos de bandas novas e estabelecidas no cenário, o CoMA oferece desde o ano passado conferências/palestras sobre os mais diversos temas (relacionados à música ou não). Nesse ano, um dos temas mais explorados foi a indústria de jogos, inclusive com palestras gratuitas oferecidas na sexta-feira pré-festival. Outra parceria sensacional montada pela organização foi com a Indie Week Toronto, evento que acontece anualmente no Canadá com bandas independentes e que em 2017 teve a participação dos brasileiros do Scalene e Trampa (cujos membros fazem parte da organização do CoMA).

Sobre essa parceria, o começo “não oficial” do festival foi justamente na quinta-feira (09 de agosto), no evento Road to Indie Week — uma espécie de seletiva, com 5 bandas pré-selecionadas (Toro, Moara, Augusta, Alarmes e Mdnght Mdnght) competindo por 2 vagas nessa semana cultural canadense. O evento aconteceu na Cervejaria Criolina e as bandas Toro e Augusta se classificaram e vão representar a cena brasiliense lá no Canadá. Congrats!

O final de semana, com os eventos principais do festival, começou em grande estilo. Na sexta-feira, a Pré do Slap se mostrou uma versão mais organizada e voluptuosa da festa de abertura realizada no ano passado. Dessa vez, além de contar com DJ Set de figuras importantes das festas brasilienses e de algumas bandas nacionais (Far From Alaska + Supercombo + Plutão Já Foi Planeta), o evento teve também um show do MC Rashid. Tudo correu bem, apesar do ingresso relativamente caro comparado ao festival (R$40 pela festa vs. R$30 pelos dois dias de festival, pra quem comprou antecipadamente) e de um leve atraso. Uma das partes mais legais da festa era a mesa de beer pong montada e super bem organizada: jogava-se gratuitamente e os vencedores ainda ganhavam copos exclusivos da festa.

Invasão de palco no show da Supercombo (Foto: Matthew Magrath)

No sábado, primeiro dia no Complexo da FUNARTE, o festival começou com um leve sinal negativo: a entrada do público foi liberada enquanto algumas bandas ainda passavam som, o que se transformou em um atraso significativo no início do festival. No fim, esse acabou sendo praticamente o único momento negativo de todo o festival. O restante do dia correu super bem, sem atrasos entre as apresentações e sem nenhum problema técnico.

Como no ano passado, as performances se dividiram em 4 palcos + 1 tenda eletrônica: os palcos principais (Norte e Sul), o Clube do Choro e o cobiçado Planetário, além da Tenda Conexões. Nesse primeiro dia, o grande destaque dos palcos principais ficou por conta da apresentação da Supercombo e isso não se deu necessariamente pela banda em si. O público compareceu em peso e participou ativamente, coisa que não aconteceu tão fortemente com os shows do Rincon Sapiência e do ÀTTØØXÁ, que foram excelentes mas acabaram sendo um pouco prejudicados pelo atraso do começo do dia e cansaço das pessoas que estavam desde cedo. O que não significa, de jeito nenhum, que foram shows desanimados: o público que ainda tinha energia fez uma troca sensacional com os artistas e mostrou que cada vez mais a diversificação dos ritmos pode e vai tomar conta dos festivais.

É impossível deixar de falar também na performance estonteante da Elza Soares. Não só pela arte e paixão envolvidas em tudo que ela faz, mas pela importância de todo seu trabalho e pela consolidação da mudança de direção dos seus anos mais recentes de carreira, colocando-a sem dúvidas em um posto de rainha que é abraçado com carisma e humildade pela artista.

Além disso, as bandas que tocaram mais cedo também cumpriram com louvor seus papéis, especialmente o Menores Atos e o Maglore, que abriram respectivamente os palcos Sul e Norte com apresentações maduras e dignas de headlinear qualquer festival. Entre as surpresas, a banda Cachimbó que abriu o Clube do Choro com sua mistura de regionalidades e ritmos e a Alarmes com um show diferente e ousado estão entre as que deixaram marcas positivas.

Vale ressaltar, nesse momento, a quantidade de experiências simultâneas que o CoMA oferece — não só para justificar o tamanho desse texto, como para explicar porquê é humanamente impossível viver tudo que o festival proporciona. Os shows nos palcos principais são alternados, mas acontecem simultaneamente com as apresentações no Clube do Choro, no Planetário e na Tenda Conexões e ainda com as conferências. Além disso, ainda tivemos novidades esse ano: um espaço de Live Karaokê aberto ao público; mesa de beer pong (a mesma da festa de abertura) e até um simulador de corrida da Red Bull.

Apresentação do Gustavo Bertoni no Planetário (Foto: Matthew Magrath)

Dito isso, uma das experiências indispensáveis do festival é assistir a algum show no Planetário. As filas ficam enormes e poucos são atendidos (cabem apenas 80 pessoas no local), mas a proximidade e o intimismo são justamente alguns dos charmes desse formato. Apesar de infelizmente não ter conseguido ver o show do Gustavo Bertoni, tive o prazer de ver a canadense Julie Neff proporcionado uma performance inesquecível que misturava suas próprias músicas com alguns covers famosos, culminando em uma última música tocada de forma totalmente acústica (sem microfonação, sem nada) iluminada apenas pelas estrelas do domo. Se você vier pro CoMA do ano que vem, tire algum tempo e não deixe de viver isso: cada apresentação ali é única e especial.

Voltando ao tópico principal, os shows do domingo pareciam claramente voltados a um público diferente do sábado (com algumas exceções) e assim foi. A média de idade parecia maior, mas os shows continuaram atendendo a todos os gostos. A Céu fez talvez o grande show da noite, com um repertório excelente e com certeza com o público mais presente. Um dos mais esperados da noite, o Plutão Já Foi Planeta começou sem muita resposta do público, mas depois de algumas músicas e participações no palco a banda conquistou os presentes, ainda que majoritariamente aqueles que já eram familiarizados com a banda. No entanto, a Flora Matos foi uma gratíssima surpresa ao lado dos chilenos do Apokálipo que chegaram até a (literalmente) derrubar uma luz do Clube do Choro.

No entanto, assim como o show da Elza Soares foi o mais importante do sábado, no domingo foi a vez da Linn da Quebrada dar voz ao público LGBT e periférico da melhor maneira possível. Uma performance visceral, imprescindível nos tempos atuais e com uma atitude quase inigualável entre os outros artistas não só do festival como de todo o país.

Apresentação do Plutão Já Foi Planeta (Foto: Matthew Magrath)

Pra resumir, o CoMA fez o que todos os festivais brasileiros têm medo de fazer: fugiu do status quo. Não apostou em grandes medalhões, deu espaço a grandes nomes que andam meio esquecidos pelo mainstream (afinal, os headliners do domingo foram Chico César e Mundo Livre S/A) e se propuseram ao desafio de não repetir absolutamente nenhuma banda que já havia tocado na edição anterior. Esse e todos os outros desafios impostos sobre o festival foram superados e resultaram em (mais) uma experiência inesquecível para a cultura do Centro-Oeste, que cada vez mais vê o CoMA se consolidar no cenário nacional e finalmente colocar Brasília no circuito de festivais.

Voa, CoMA! Nos vemos em 2019!

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Entrevista Perfil

Conheça a banda Augusta, promessa da música brasiliense

Por  Tayane Sampaio

Já disse, várias vezes, que a cena musical de Brasília está passando por um momento bonito e prolífico. São muitas bandas na ativa, de vários estilos, pra todos os gostos. A Augusta é uma das bandas que eu coloco, sem receio algum, na minha lista de promessas da música brasiliense.

Taís Cardoso (voz e violão), Lucas Maranhão (voz e guitarra), Gabriel Peres (bateria) e Davi Figueiredo (baixo) já lançaram alguns singles nos serviços de streaming, e esses cartões de visitas só aumentam as expectativas do que está por vir. No primeiro semestre deste ano, a Augusta irá se apresentar para o mundo por meio de seu primeiro EP, que se tornou possível com a ajuda de várias pessoas que contribuíram com o financiamento coletivo da banda.

Gabriel, Lucas e Taís bateram um papo com a gente sobre suas trajetórias, inspirações, sonhos e planos. Vem conhecer a Augusta!

Os integrantes da Augusta são novos, todos têm 19 anos, e tiveram o primeiro contato com um instrumento musical ainda na infância, o que desencadeou o interesse por esse universo. O Gabriel, por exemplo, cresceu inserido nesse mundo, pois o pai e o tio são músicos. “Desde pequeno, eu sempre estive envolvido com a música. Fazia aula de piano, depois passei pra guitarra… foi mudando, mas a música sempre esteve muito presente. Tive influência total [da família], porque eu os via tocando, tirando um som e achava massa demais, queria fazer também”. Gabriel chegou a tocar com o pai, em alguns shows, e gravou uma música pro CD dele.

Lucas, aos oito anos de idade, se interessou por um violão que encontrou largado em um canto de sua casa. O menino cismou que “queria aprender a tocar, aí eu ficava incomodando meus pais, falando que eu queria aprender, até eles me colocarem em uma aula”. O seu objetivo era se tornar um guitarrista.

Taís se interessou pelo violão mais ou menos na mesma idade que Lucas, mas a vontade dela de aprender o instrumento surgiu por ver um amigo tocar guitarra. Ela nos contou que “com uns 13 anos, eu ganhei uma guitarra, mas o violão sempre foi meu instrumento principal. Depois toquei teclado também, fui vendo várias coisas diferentes”. Apesar de ter começado cedo com o violão, foi aos 16 que Taís se interessou pelo canto. “Eu comecei a cantar por uma necessidade de expor os sentimentos, isso que me motivou”, afirmou.

Como de costume, a Augusta é formada por um grupo de amigos. Lucas disse que se aproximou de Gabriel, que é seu primo, pelo interesse mútuo pela música. Davi, que estudava com Lucas, se juntou aos dois e formaram o que seria o primeiro embrião da banda. O trio costumava tocar músicas de outras bandas quando as autorais começaram a surgir. Uma dupla de metais, trombone e trompete, teve uma breve passagem pela Augusta. Em 2016, Taís entrou pro time. Amiga de Lucas desde o colégio e colega de turma na faculdade, ela aceitou o convite pra fazer parte do projeto.

Quando o assunto é inspiração, os integrantes do grupo mostram pluralidade, que é refletida no trabalho do grupo. Gabriel se inspira nos bateristas das décadas de 60 e 70, do rock clássico britânico, e tenta incorporar a desenvoltura dessa galera no seu estilo. Em território nacional, sua maior referência é João Baroni, do Paralamas do Sucesso. Apesar do pé no rock clássico, ele se mantém antenado no que está rolando na cena atual. “Daqui, tem o Paulo Sampaio, da Dona Cislene. O estilo dele é um que me interessa bastante, não que eu toque parecido, mas acho que de influência daqui de Brasília seria ele. Eu gosto bastante do jeito dele de tocar.”

Taís citou a performance intimista do The xx como uma inspiração, além de falar da Raquel Reis, outro tesouro da cidade, e Tulipa Ruiz. Assim como Lucas, ela gosta muito de bandas nacionais e os dois compartilham muitas referências. Quando perguntei o que ela escutada no dia a dia, Taís disse estar descobrindo o mundo das trilhas sonoras de animes. “Eu tô começando a ver umas animações e tô ouvindo as trilhas sonoras, que são incríveis! É meio mundo Disney, mas esse instrumental orquestral… A que tô ouvindo, no momento, é a trilha de ‘Sussurros do Coração’”, contou.

A performance enérgica do Cage the Elephant é uma inspiração pro Lucas, que gosta da entrega do grupo nos palcos e da ideia de que cada show é um espetáculo diferente e você deve dar o máximo de si praquele momento único. Como referência, ele tem as bandas mais atuais e afirma que os cariocas do Baleia são uma grande referência pro grupo.

Baleia, uma banda que foi muito citada durante a nossa conversa, também entra pra lista de bandas com quem a Augusta gostaria de dividir o palco. “A gente gosta muito deles, dividir o palco um dia seria incrível… a Ventre também!”, Lucas contou. Sonhando mais alto, Taís citou os Novos Baianos, Lucas pensou no Milton Nascimento e Gabriel lembrou do Lenine “eu gosto bastante das músicas, do estilo dele… acho que seria um acontecimento muito legal”.

Augusta @2017 | Por Breno Galtier
Augusta @2017 | Por Breno Galtier

Sobre os três singles lançados “Tudo em Ordem”, “Olhos Verdes” e “Ônibus (Peso da Semana)”, eles contam que decidiram lançar antes do EP por se tratarem de composições antigas, que existiam antes da formação atual da banda. Lucas contou que “a Taís ajudou no processo de produção delas, aí quisemos lançar antes, até pra ir nos conhecendo e testando o nosso estilo. As três músicas são minhas e mudaram muito, porque a partir do momento que mostrei pra banda, cada um acabou influenciando na forma que a música tomou”.

Mesmo com as poucas músicas lançadas, a Augusta se manteve presente nos palcos da cidade. Os vários shows realizados nesse curto período de existência do grupo trouxeram experiência de palco e de vida pro grupo, que vislumbrou o mundo da música além do palco. O contato com bandas mais experientes e o envolvimento maior com a cena criou essa percepção de que o trabalho de ter uma banda vai muito além de compor, ensaiar e tocas suas músicas. “Essa bateria de shows criou um maturidade na gente, pra apresentar as músicas, até pra apresentar esse EP, agora” contou a vocalista.

As músicas do vindouro EP foram gravadas no começo de dezembro. “Desde março, gente tá junto com o Henrique Bepo (MDNGHT MDNGHT) produzindo as músicas. São 5 inéditas e “Aguaceiro”, que não lançamos nas plataformas de streaming, mas já tínhamos lançado no Youtube”, o vocalista revelou. Ainda sobre a participação do Bepo no processo, Lucas disse que funcionou bastante e que isso acabou moldando o som da Augusta.

Lucas garante que o indie-folk-MPB, como eles gostam de chamar, continua, mas com algumas novidades. Taís destacou os ritmos e contou que tem uma música com piano. Ela disse, ainda, que a ideia inicial não era compor um EP. Os dois vocalistas, Taís e Lucas, são os responsáveis pelas letras das músicas. Segundo Lucas, as canções são as primeiras colaborações dos dois e que acabaram funcionando muito bem em conjunto. As letras do EP misturam coisas que aconteceram com os compositores e coisas que poderiam ter acontecido. O músico revelou que gosta de falar que eles contam histórias, que curtem supor situações e até sentimentos.

A banda está colocando todos seus esforços pro lançamento do EP, planejando cada detalhe, pra entregar uma obra que tenha a cara e a alma da Augusta. Depois, os planos são de tocar bastante e alçar novos voos, conhecer novos territórios e levar a música deles pra outros estados. Ah, e vai rolar clipe também!

Escute a banda Augusta:

Foto: Breno Galtier