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Por que não respeitamos o funk?

Por Felipe Ernani

Nos anos mais recentes, o funk brasileiro se estabeleceu de vez como a música das pistas de dança pelo Brasil todo. Hoje, faz sucesso tanto nas festas de onde se originou — os famosos bailes funks — quanto entre as celebridades e alta sociedade do país.

Mas, ainda assim, perdura a marginalização do gênero e o preconceito com os artistas deste. Algumas pessoas ainda insistem em agir como se só ouvissem funk de forma irônica. Outros ouvem e gostam, “mas só em festa”. Respeitar o gênero ainda é muito difícil. Por quê?

Pouco a pouco, os argumentos vão caindo. Não por boa vontade do público que é contra ele, mas porque os artistas têm se esforçado e investido cada vez mais e o resultado é palpável.

O funk deixou de ser música (exclusivamente) da favela. Passou a ser um patrimônio cultural brasileiro exportado para outros países — claro que o primeiro exemplo que vem à cabeça é o de Anitta, que desde o início da carreira sempre exaltou a cultura do funk e recentemente o exportou (de forma mais compreensiva para o exterior) com “Vai Malandra”.

Mas não é só a Anitta. Mesmo dentro do Brasil, cada vez mais artistas são influenciados diretamente pelo funk carioca. O BRAZA, banda formada por 3 dos 4 integrantes do extinto Forfun, tem influências claríssimas do gênero que serão expostas para o Brasil e o mundo quando a banda subir no palco do Lollapalooza, no domingo (25). E o próprio Forfun, no seu disco de despedida, Nu (2014), não apenas se mostrou influenciado pelo funk como o homenageou e falou sobre ele na música “O Baile Não Vai Morrer.

Um dos principais argumentos de quem se posicionava contra essa cultura era a “falta de qualidade” nas músicas produzidas. Aí, recentemente, aparece o MC Fioti com “Bum Bum Tam Tam, usando um sample da “Partita em Lá Menor de Bach em cima de um beat e transformando uma das melodias mais “requintadas” da música em uma “flauta envolvente”. Ou o MC Livinho, que era violinista de igreja, e hoje em dia compõe músicas extremamente melódicas e ricas em detalhes como “Fazer Falta. Ou até mesmo o MC G15, que no seu hit “Deu Onda” faz uma quebra de melodia e harmonia que é pouquíssimo usada na música pop.

Não à toa, MC Fioti foi mais um que exportou sua canção. “Bum Bum Tam Tam” recentemente ganhou versão internacional com participações de nomes estrangeiros conhecidos, como Future e J Balvin.

E não são só as músicas: recentemente, uma amiga que está em Portugal mandou uma foto de um cartaz mostrando que o MC Kevinho vai se apresentar por lá em breve. Kevinho, inclusive, é um dos nomes que mais ajudou nessa “explosão” do funk.

O garoto de Campinas teve seu primeiro hit com “Tumbalatum” e esperava-se que, como a grande maioria dos outros MCs, o sucesso seria passageiro. Mas ele (e sua equipe) soube se estabelecer e lançar hit após hit: “Olha a Explosão”, “Encaixa”, “O Grave Bater”, “Rabiola”…

E, parando pra analisar, todos os hits de Kevinho seguem uma fórmula parecida; no entanto, todos têm detalhes que os diferenciam, mesclam o funk com algum ritmo diferente, trazem alguma participação de um artista de outro nicho, usam algum instrumento que não é da linguagem comum do funk, e isso transforma cada uma dessas músicas em muito mais do que só uma melodia grudenta.

Mas agora chegamos no ponto crucial do começo do texto: com tudo isso, por que o funk ainda é marginalizado e ainda sofre preconceito no Brasil, se até fora do país o ritmo já é aceito e amado?

A resposta não está tão longe. O “brasileiro médio” — nesse caso, o público não marginalizado — não consegue aceitar a fluidez dos movimentos artísticos. Não consegue ficar em paz sabendo que o seu amado rock e a sua querida MPB estão ficando obsoletos e cedendo espaço para o funk, para o rap/hip hop, e para os gêneros que buscam a cada dia se inovar mais. Mais do que isso, não entendem que a função da música não é eleger o melhor guitarrista do mundo, é fazer o ouvinte sentir algo, e isso o funk tem feito muito bem. Há muito a aprender com o funk brasileiro, e quem se recusa a aceitá-lo só vai ficando cada vez mais atrasado.